quinta-feira, 7 de agosto de 2014

O assassino do parque – Ana Cláudia dos Santos Figueiredo

Às sete horas da manhã de uma sexta-feira, Ana já estava acordada, pois sua ansiedade era muito grande, enfim havia chegado a data mais esperada para ela nas últimas semanas. Sofria de insônia, pois não aguentava mais tanta espera, as expectativas eram as maiores possíveis. Ela se recordava de como foi difícil convencer seus pais para deixá-la ir pela primeira vez ao playcenter, o melhor parque de diversões em sua opinião, e finalmente ia pra lá por meio de uma excursão de sua escola. Foi na 5ª série, ela tinha 11 anos de idade.
Ainda vestida de pijama, desceu as escadas de sua casa, direcionou-se à cozinha, e como imaginava seus pais já estavam acordados, sentados à mesa tomando o café-da-manhã. Sua mãe a olhou com certa surpresa e disse:
- Menina, mas já acordada?! O seu passeio é só às nove da manhã, e ainda são sete!
- Ai mãe... Não consegui dormir direito – disse Ana, bocejando.
Sentou numa cadeira, comia lentamente, apenas imaginando o cenário daquele parque, que por muitas vezes seu irmão, que já tinha ido lá, contava coisas para Ana. “Como seriam as montanhas-russas? Às 18h00 quando a noite começar a surgir, a noite do terror será iniciada...”. Turbilhões de pensamentos como esses se passavam pela cabeça daquela menina.
Quando o relógio mostrou que era 08h40min, ela já estava pronta para sair de casa, vestida numa roupa confortável, cabelos trançados, provisões em sua mochila, tais como algo para comer, blusa de frio, escova de cabelo, enfim, coisas que ela achava necessárias para passar o dia fora de casa.
Despediu de seus pais, caminhou em direção a escola (que por sinal situa-se duas ruas abaixo de sua casa), chegando lá, ficou decepcionada, percebeu que os ônibus não haviam chegado.
Dentre tantos alunos em frente à escola, ela conseguiu localizar sua melhor amiga, Kelly, em frente ao portão. Ficou feliz em vê-la, andou ao encontro dela e disse:
- Oi Kelly!
- Iaê Ana, conseguiu dormir direito hoje?
- Quê nada! Fiquei muito ansiosa...
- E eu tive pesadelos. – disse Kelly.
Não demorou muito, quatro ônibus chagaram, professores faziam a chamada e os alunos entravam pouco a pouco. Todos os veículos lotados de pessoas com muitas expectativas.
Demorou uma hora para chegarem ao parque. Quando Ana entrou no playcenter, sentiu uma sensação incrível de felicidade, ficou impressionada com cada detalhe, a montanha-russa enorme, a grandiosidade do parque, tudo aquilo a impressionava. Conversou muito alegremente com Kelly:
- Uau! Preciso ir em todos os brinquedos, inclusive em todas as atrações da noite do terror!
- Sei não Ana... Não gosto muito dessas coisas e nem do que pode acontecer... – disse Kelly.
- Afff! Para com isso! Não vai acontecer nada, viemos aqui para nos divertir e você fica nessa frescura! – disse Ana, repreendendo Kelly.
- Você não sabe o que sinto nem o que sonhei por isso você fala dessa maneira! – falou Kelly, quase chorando.
Ana sentiu-se culpada por falar com ela daquela maneira rude, tentou compreendê-la:
- Está bem... Conte-me, o que você sonhou?
- Foi horrível Ana, era muito sangue no lugar! – contou Kelly, de uma maneira desesperada.
- Olha amiga, não se preocupe, são só sonhos, simplesmente é o nervosismo, afinal hoje é noite do terror não é mesmo?! Te dou razão para você sentir medo – disse Ana, tentando confortá-la.
- Geralmente eu costumo acreditar em sonhos – Kelly diz, sussurrando.
- Quer saber, vamos esquecer esta história, ânimo! Temos muito que fazer ainda.

          *                                                  *                                                  *
O que Ana não sabia, era que Kelly possuía razões para acreditar em seus sonhos, uma vez sonhou com uma voz de uma mulher pedindo ajuda, gritando socorro. Apenas uma voz. Certo dia ela estava voltando da casa de sua amiga a noite, andando na rua ouviu um grito, para seu desespero reconheceu a voz do seu sonho, uma mulher pedindo socorro porque estava sendo violentada por um homem, ele estava a forçando para beijá-lo.
Kelly resolveu pedir ajuda para qualquer outra pessoa que aparecesse, correu pela rua e encontrou um homem, falou desesperadamente com ele:
- Me ajude, por favor, uma moça está sendo violentada, ela precisa de ajuda imediatamente!
- Como assim garota? Quem está violentando ela? – disse o homem desconhecido.
- Não sei! Só vi que ele a forçava para beijá-lo, e até coisas piores! Ela precisa de ajuda! Eu sabia... Tive esse sonho...
- Como assim sonhou com isso? Bem isso não importa, Vamos agora pra lá- disse o homem. Kelly estranhou a atitude dele, o tom de voz que ele falou, mas no momento estava desesperada demais com o que estava acontecendo.
Chegaram ao local, dava para ouvir os gritos da mulher do sonho, o desconhecido que iria ajudar, foi imediatamente para cima do agressor, os dois se batendo. Kelly e a mulher gritavam apavoradas sem saberem como reagir.
Para a surpresa de todos, o homem com quem Kelly pediu auxílio tirou uma adaga do bolso, apontou para o outro e disse:
- Está mais do que na hora de sua raça ser massacrada!
E o apunhalou.

          *                                                  *                                                  *
Kelly acabou concordando sobre o que Ana havia dito, para ter ânimo. Elas foram em várias atrações, estava um dia bonito, tudo perfeito, sem chuva, o que não causaria imprevistos com os brinquedos. Logo depois, foram no looping, uma das melhores montanhas-russas do parque. Na fila do looping, próximas de chegar à vez delas, um menino com aparência de que tinha quatorze anos de idade falou:
- Ei gatinha, quer ficar comigo? Meu amigo também está a fim, podemos revezar!
- Você está louco? Vim aqui para me divertir não para ter pesadelos com você! – disse Ana, com raiva.
- Deixa disso guria, eu não sou pra ser jogado fora! – o garoto fala, tentando agarrar Ana.
Ela lhe dá um tapa na cara, o menino já ia levantar a mão para bater nela, porém um funcionário do parque que era responsável por monitorar a montanha-russa interviu e o barrou:
- Quem bate em mulher é covarde seu pivete! – diz o funcionário, irado.
- Se liga tio, você com essa profissãozinha idiota não tem postura pra me ameaçar não! – diz o garoto.
- Eu acabaria com você aqui mesmo, mas dou três segundos para você sair dessa fila e não incomodar mais ninguém, senão eu chamo o segurança, e aposto que você não vai querer que eu faça isso, ou será que vai?! – o funcionário fala, com toda raiva possível.
O garoto acaba sendo intimidado, sai da fila envergonhado, com as pessoas o vaiando por sua atitude.
- E vocês duas aí – o funcionário fala pra Ana e Kelly – tomem cuidado, não se pode confiar em mais ninguém hoje em dia.
- pode deixar moço. – diz Kelly, estranhando tudo isso.
Com esse acontecimento, elas resolveram esquecer e curtir o parque.
Quando olharam no relógio, já era 17h40min, logo ia escurecer e os “monstros” seriam soltos. As duas meninas foram para a área do parque onde haveria uma apresentação da noite do terror. Quando deu seis horas, as luzes se apagaram, e vermelhas foram acesas, estas não iluminavam com tanta intensidade.
Começou a apresentação, cheia de efeitos especiais, a maquiagem dos “monstros” eram perfeitas, para realmente assustar as pessoas.
Depois, Kelly começou a falar com Ana, desesperada e assustada:
- Ana, eu quero ir embora! Não suporto mais tudo isso!
- Calma Kelly! São apenas pessoas maquiadas, nada mais.
- Não é isso, tenho pressentimentos e não gosto disso! – disse Kelly.
- Vamos voltar a este assunto novamente?! Fala sério Kelly! Se liga, não precisa ficar assim. Vamos fazer o seguinte, pra você perder esse medo idiota, iremos às casas de terror, só pra você ver como vai ser legal, logo estaremos rindo de tudo, dos sustos que vamos tomar!
- Ai Ana...
- Deixa de besteira, afinal estamos aqui para curtir o dia, e estou curiosa pra ir no labirinto dos espelhos, falam que lá é a melhor atração. – disse Ana. Ela não sabia, mas se arrependeria por falar isso.
Andaram pelo parque (com muitos monstros no caminho) até chegarem à entrada da casa de espelhos, lá dentro havia um labirinto, uma passagem assustadora até o final da atração. A fila estava curta, dava para ouvir os gritos das pessoas, isso era considerado normal, já que todos entravam lá para levar sustos.
Estava quase chegando a vez delas, Kelly ficou segurando muito forte o braço de Ana, sua mão estava gelada, ela parecia estar apavorada, pois falava a todo instante sobre pressentimentos. Ana pensou “ela está com medo dos monstros, mas não quer admitir, melhor eu ignorá-la, já estou cansada disso tudo”.
Finalmente entraram, logo de cara havia monstros por todos os lados, seus reflexos e das pessoas por todos os cantos, foram muitos sustos. Ana continuou caminhando, uma coisa chamou sua atenção, um dos espelhos estava inclinado, e refletia de forma diferente dos outros, parecia uma porta que não estava fechada direito. Virou-se para comentar isso com sua amiga, mas percebeu que ela não estava por perto, resolveu procurá-la pelo labirinto. “Depois volto nesse lugar”, pensou Ana.
          *                                                  *                                                  *
Ana mal sabia que Kelly havia se separado propositalmente, antes dela se virar, Kelly resolveu andar por outra entrada do labirinto. Ela simplesmente não suportava mais ficar aborrecendo a amiga, não gostava do fato de que ninguém a entendia, seus medos, pressentimentos, pra todo mundo aquilo era besteira. Enxugou suas lágrimas, realmente estava triste, precisava de um momento sozinha para refletir.
Até que ela viu momentaneamente um vulto, indo na mesma direção que Ana havia seguido, até a porta no espelho. Para Kelly, aquilo parecia familiar. Ela entrou e encontrou uma sala um pouco escura, tropeçou em algo e caiu, sentiu algo molhado e quente onde havia apoiado suas mãos, até que de repente, luzes de quatro monitores acenderam então ela podia enxergar onde havia tropeçado, levou o maior susto de sua vida, queria gritar, mas não conseguia, não havia forças em seus pulmões por causa da cena à sua frente.
Corpos, muitos corpos, sangue por todos os lados, era a coisa molhada que tinha sentido. Um pouco mais à frente uma figura em pé, a que ela seguiu e descobriu porque lhe parecia familiar. O funcionário que defendeu Ana e ela do garoto, mas não era isso que chamava sua atenção, somente naquele momento veio em sua memória, a mesma silhueta do homem que há algum tempo atrás ajudou a mulher do sonho de Kelly.
- Você... Mas... Você fugiu... Como pode...?! – disse Kelly, apavorada.
- Agora você me reconhece não é mesmo?! Confesso que fiquei nervoso na fila da montanha-russa achando que me reconheceria, pode me chamar de David, queridinha.
- Não me chame assim! Seu monstro! Assassino! Já não bastava ter matado aquele homem? Mas essas pessoas inocentes?!
- Você não entende garota, estou fazendo um bem para a humanidade, olhe bem para essas pessoas, o que você vê em comum? – pergunta David, melancolicamente.
Muito apavorada, quase não acreditando no que estava acontecendo, Kelly olhou para aqueles corpos e disse:
- São todos... Garotos?! – percebeu que um dos corpos era o mesmo garoto da fila da montanha-russa.
- Cretinos seria a palavra certa, todos aqueles que são machistas, explora as mulheres achando que podem tudo! – disse David.
- Isso não te dá o direito de matá-los! – Kelly diz com raiva daquele homem à sua frente.
- Você quer ouvir minha história Kelly? Quer saber o porquê de eu possuir razões para isso?!
- Não quero ouvir nada de você seu louco!
Kelly tenta voltar pra porta que entrou, porém estava trancada. Ela não tinha opções senão esperar ele ficar distraído enquanto fala, assim poderia pensar numa maneira de escapar daquele  lugar. Percebe que aqueles monitores mostram lugares que estão sendo filmados dentro da casa de espelhos, ela olha sua amiga no visor, e percebe que ela está procurando-a, lágrimas enchem seus olhos, “por que me separei de você?” pensa Kelly.
- Você não tem opções garota, tenha paciência, você entenderá tudo. Sabe, eu fui fruto de um estupro, uma criança indesejada, porém minha mãe teve paciência, cuidou de mim. Ela era pobre, foi mãe aos dezesseis anos, não tinha condições nenhuma de sustento, ainda mais de cuidar de uma criança. Sua única alternativa foi aceitar a proposta de meu pai, o homem que fez da vida dela um inferno, realmente ela não tinha família e me amava demais para me abandonar. Foram muitas noites que o desgraçado do meu pai batia em minha mãe, eu entrava na frente dele, tenho as marcas até hoje... Até que um dia, ele estava bêbado demais, veio com uma adaga pra cima de minha mãe, bem na minha frente ele a apunhalou no coração, sabe quais foram suas palavras quando a matou? “para o bem da humanidade”.
Nesse momento, Kelly percebeu uma lágrima no rosto dele, apenas uma. Ela quase teve pena dele, quase.
- Ela... Ela foi uma guerreira para mim... Não merecia aquele fim... Quantas vezes meu pai se aproveitava dela, contra sua vontade, nos ameaçava se contássemos uma só palavra para alguém. Foi muito doloroso para mim, o desgraçado conseguiu esconder o corpo em algum lugar que não sei até hoje. Um dia simplesmente não aguentei mais olhar pra cara daquele cretino, dos maus tratos que eu sofria e a raiva que sentia pela morte da minha mãe. Numa madrugada, ele já estava dormindo, resolvi acabar com ele de uma vez por todas, eu sabia onde ele guardava a mesma adaga que matou minha mãe, fui ao quarto dele e fiz a mesma coisa, o que ele merecia, apunhalei-o no coração. Deu tempo de ele ouvir minhas palavras antes de falecer, “o melhor para a humanidade”.  Acredito que eu tive mais razões para falar aquilo. Fugi, tenho várias identidades,  tenho meus contatos para disfarces, ninguém nunca suspeitou de mim.
- Você... Você é um monstro! – disse Kelly.
- Não garota, o monstro era ele e muitos outros iguaizinhos a ele. Infelizmente no nosso mundo há muito desse tipo de raça, deve ser massacrada.
Kelly sentiu um arrepio, lembrando-se das mesmas palavras que ele havia dito na noite em que presenciou um assassinato, naquele dia David havia fugido antes mesmo que alertassem para a polícia. Um sentimento de raiva alastrou-se sobre ela, não aguentou, aproximou-se de David e lhe deu um soco em seu queixo, reclamando de dor ele disse:
- É contra meus princípios bater em mulher, você é especial sabia? Ouvi sua conversa com aquela sua amiguinha, sonhou com isso não foi? Isso minha cara, é intuição feminina, admiro muito as mulheres, junte-se a mim, sei que você não possui família, criarei você como uma irmã.
- Como...? Como você sabe?! Não contei isso a ninguém! – disse Kelly, assustada, realmente isso era verdade, mas nunca havia mencionado à ninguém que não tinha família, vivia com sua vizinha, ela era sua tutora e sua vida com ela não era a das melhores.
- É fácil conversar com os professores aqui no parque, eles sabem sobre você claro, caso contrário você não poderia estar matriculada na escola. – disse David. 
- Eu nunca irei me juntar a você! Nunca!
Kelly tentou abrir a porta desesperadamente, sem sucesso. David começou a falar:
- Minha cara, eu te dei escolha, agora sou eu que não tenho escolha nenhuma, a propósito, não que seja importante mencionar isso, utilizo a mesma adaga, para me lembrar de que sempre precisarei de vingança. Nomeei-a de “iustitia”, um nome em latim, com significado de justiça. Aguardo ansiosamente sua amiguinha. E lamento muito ter de matar você, é um desperdício...
E lançou a adaga, em direção ao seu coração.

          *                                                  *                                                  *
Ana procurou Kelly por todos os lugares do labirinto e não a encontrou, simplesmente não suportava mais os sustos que levou naquele lugar. Resolveu voltar ao local onde havia encontrado a porta, o único lugar da casa de espelhos que não tinha explorado. Chegou lá, sua curiosidade estava ao extremo, hesitou um pouco, mas acabou entrando mesmo assim, achando que aquele local fazia parte da atração.
O susto que tomou quando passou por aquela porta, foi maior do que todos os outros daquele dia, uma cena horrível e cruel. Ela não sabia o que pensar, os corpos estavam espalhados de forma sinistra e cruel pela sala, apenas pensava “faz parte da atração... Faz parte Ana, acalme-se”, porém o que seus olhos enxergavam não a convencia de que era de mentira, Lágrimas escorriam em seu rosto, gritou da maneira mais desesperada que pôde, sabia que isso seria inútil, pois eram normais os gritos naquela atração.
         
          *                                                  *                                                  *
David estava nas sombras, divertindo-se silenciosamente da reação da colega de Kelly, iria esperar o momento certo para aparecer. Trancou a porta com um dispositivo (possuía travas automáticas), e aguardou.
          *                                                  *                                                  *
Ana observou os corpos, todos eram meninos a não ser... Embranqueceu com o espanto, lamentou chorando mais ainda, dessa vez de uma dor profunda em seu interior, bem abaixo dela, Kelly jazia no chão, coberta de sangue, com uma faca encravada em seu coração. Ana não conseguia controlar suas emoções, não podia acreditar que sua melhor amiga estava morta.
Voltou em direção à porta, tateou a procura da fechadura para sua surpresa percebeu que era automática, e estava trancada. Procurou alguma saída, sem sucesso.
Os monitores se acenderam, David revelou-se, Ana o reconheceu imediatamente como o funcionário que presenciou o incidente na fila da montanha-russa. Com um tom de voz sombrio, disse:
- O que faz aqui garotinha? Caiu na isca não é mesmo? Por que não deu ouvidos à sua amiga em?! A culpa é sua que ela esteja morta! Tenho de admitir, ela lutou bravamente, tem um soco muito forte se me permite dizer. – Disse o funcionário, passando a mão no queixo, era praticamente imperceptível no escuro, mas Kelly havia deixado um hematoma.
- Como sabe o que ela me disse?! – falei desesperada.
-Ouvi a conversinha de vocês, e tive uma conversa interessante com ela antes de eu mata-la... Lamento, um desperdício perdê-la, mas não tive escolhas.
- Seu maluco! Maníaco! Psicopata! Somente uma pessoa com um coração podre como o seu teria coragem para fazer uma coisa dessas! – disse Ana, insultando-o, explodindo de raiva, indignação, e sentimentos difíceis de serem descritos.
- Tenho minhas razões hã... Qual o seu nome mesmo? Ah claro, Ana! Não suporto meninos aproveitadores de mulheres, e nos parques é onde mais se encontra essa espécie, deveria me agradecer por isso, dei uma lição naquele garoto da fila. – disse David, apontando para o corpo do garoto, até então Ana não tinha reparado.
Ela gritou, as lágrimas escorriam com mais intensidade em seu rosto, David começou a falar de uma história sobre seu passado. Ana o ignorou totalmente, aproveitou sua distração para explorar a sala visualmente, com a ajuda da luz dos monitores, conseguiu ver uma rachadura fina em uma das paredes oposta onde estava posicionada, sabia que eram espelhos, fez a primeira coisa que veio em sua cabeça, correu em direção à rachadura, David percebeu, tentou lançar a adaga na direção dela, a quase a acertou, porém quicou na parede à centímetros de Ana, mas ela foi ágil e conseguiu atravessar onde havia a falha . Sentiu estilhaços de vidros afundarem em sua pele, uma dor agonizante.
As pessoas do outro lado a olharam surpresas, Ana estava caída, começou a falar rapidamente e desesperadamente, chorando:
- Socorro! Ajudem-me! Pessoas mortas! Psicopata, louco! Minha amiga, eu...
-Calma menina – disse um homem, era alto e parecia ter vinte anos – Que história é essa? Por que você está assim machucada? Onde isso?
Ana, sem forças para levantar apontou o dedo em direção ao buraco que havia feito no espelho. Entraram, todos ficaram horrorizados com aquele cenário, imediatamente chamaram os funcionários do parque.
O assassino não deixou pistas de seu paradeiro, ninguém o viu, ou se viu não sabia quem era ou o que ele havia feito. Logo, a polícia chegou, e uma ambulância também, para socorrer Ana.
Foi um caos naquele dia, não havia como esconder das pessoas o ocorrido. Amigos e parentes tentavam consolá-la visitando-a no hospital, mas a dor que ela sentia, da perda de sua amiga era muito grande. Pior que isso era a culpa, que se alastrava sobre ela, aquela menina de apenas onze anos, passando por uma situação daquelas.
Vinte e três mortos, somente uma menina, Kelly. Todos jovens com sonhos e ambições, não se falava outra coisa nos noticiários. Não havia informações sobre o assassino, a não ser o depoimento de Ana, o que não trazia respostas úteis.
O playcenter foi fechado, ninguém mais acreditava que poderia haver diversão naquele local depois do desastre marcante.
Sobraram apenas lembranças para Ana, os dias felizes que passava ao lado de Kelly, sua melhor amiga. Ela havia lhe avisado, mas Ana não deu ouvidos, o sentimento de culpa nunca foi embora. A cada dia que passa ela teme, aquele assassino estava à solta, sabe-se lá o que mais ele é capaz de fazer ou ter feito.
          *                                                  *                                                  *
Passaram três anos, Ana já estava recuperada dos ferimentos, tentava levar uma vida normal. Quando estava voltando da escola e chegou em casa, pegou as correspondências como de costume, havia uma carta endereçada à ela mas sem remetente.
Abriu-a, dentro dela estavam palavras escritas com recortes de revista:
“Uma já foi, aguarde sua Vez. Iustitia”.

O pavor voltou a tomar conta de seu corpo.

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